“Fui punido pela ausência de debate de princípios”

O Globo

Derrotado nas urnas depois de quase 20 anos de vida pública e cinco mandatos como deputado federal, Paulo Delgado (PT) diz que seu fracasso é resultado do desgaste do voto ideológico. “Fui comido pela ausência de debate de princípios”, afirma. Ele acusou a maioria de seus concorrentes de ter comprado o apoio de vereadores e prefeitos. E disse que seu partido foi castigado por alianças como a com o ex-governador de Minas Newton Cardoso (PMDB): “O povo puniu o PT”.

O senhor tem explicações para sua derrota após cinco eleições?

PAULO DELGADO: Foi a eleição do pragmatismo puro e sem princípios. Os prefeitos foram os principais cabos eleitorais e só falavam em emendas parlamentares e em Orçamento da União, não houve debate de idéias. Fui comido pela ausência de debate de princípios. Minhas cinco eleições foram sempre as de um formulador de opiniões, de um debatedor. De repente, tive de enfrentar concorrentes que construíram hospitais privados com dinheiro público.

O senhor considera que o voto ideológico está com os dias contados?

DELGADO: O deputado mais votado do PT em Minas Gerais é um advogado desconhecido do estado, mas conhecido de empresas com problemas. Chegou a envolver a Igreja em sua campanha. Nós (o PT) não teremos uma bancada de deputados, e sim de vereadores federais. O povo puniu o PT, com algumas exceções. Não tem nenhum petista no Sul e no Sudeste que esteja entre os dez primeiros. Em Minas, o primeiro é o 19 geral. Mas, tudo bem: é uma onda de degradação na política que vai passar.

E as eleições majoritárias?

DELGADO: Essa foi a eleição da devassidão eleitoral, sem propostas e programas de governo. Uma eleição de um país visto como um asilo: tudo de graça (para o eleitor), simplesmente casa, comida e roupa lavada. Houve também uma desconexão entre as campanhas majoritárias e proporcionais. Em Minas Gerais, por exemplo, o PT perdeu o viço ao preferir Newton Cardoso (ex-governador, do PMDB) ao próprio PT e pagou o preço de ver o PSDB crescer no estado.

Como o senhor avalia o retorno de colegas do PT citados em escândalos?

DELGADO: Eles são os senhores dos eleitores municipais. O problema é que os prefeitos em todo o Brasil que se vincularam, nessa eleição, a compradores de voto de todos os partidos transformaram esta campanha na mais cara e ilegal da história. Quase nenhum prefeito ou vereador resiste hoje a uma investigação.

Como assim?

DELGADO: Vereadores foram comprados, e por todos os partidos sem exceção. Como a lei obrigava a ter o caixa um na campanha de rua, o caixa dois se terceirizou com o vereador e com o prefeito. Outra coisa que aconteceu foi o renascimento do filhotismo. Aqui em Minas são dez filhos de deputados eleitos. O mais votado tem 30 anos de idade. O pai dele deu a ele 300 mil votos de presente.

O que o senhor pretende fazer daqui para a frente?

DELGADO: Sou professor por profissão e político por decisão do eleitor. O que eu entendi é que os meus eleitores querem que eu volte a ser professor. Fui deputado com honra e voltarei a ser professor com muita honra.

Paulo Delgado
Paulo Delgado
Sociólogo, Pós-Graduado em Ciência Política, Professor Universitário, Deputado Constituinte em 1988, exerceu mandatos federais até 2011. Consultor de Empresas e Instituições, escreve para os jornais O Estado de S. Paulo, Estado de Minas e Correio Braziliense.

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